Momentos.
Adoro refastelar-me no cadeirão da secretária, pernas esticadas em cima da soleira da portada do terraço virada para o verde do arvoredo que a minha vista alcança e deixar-me levar pela música e pela leitura.
São momentos ininterrompíveis de tranquilidade que me transportam a uma placidez interior onde mergulho e deixo-me arrastar nas ondas da sonata que me envolve.
Beethoven acompanha-me na leitura do livro que escolhi para esta tarde e, apesar de já o ter lido variadíssimas vezes, a poesia não me cansa; leio e releio os mesmos poemas vezes sem conta para absorver todo o seu significado.
A música espelha-se na minha alma e a poesia é um momento único, onde me deleito e enriqueço.
Fecho o livro docemente. Ele sabe que voltarei.
A música continua no embalo do fim do dia…
Pacto
Do pacto que o Verbo celebrou comigo
há sempre um artigo que sempre subsiste
Deixar que as palavras apenas exprimam
o que sem palavras tentava exprimir-se
Deixá-las que rompam da noite da vida
para que suspendam a morte do dia
David Mourão-Ferreira in, Obra Poética (1948-1988)
A págs. 373 (Editorial Presença)